17.6.07

A última fronteira

Na entrada do edifício, o rapaz de bigode recebe de braços esticados para carregar as sacolas de compras:

- O senhor trouxe o visto?
- Sim! Conversei hoje com meu amigo de Jebel Ali, aqui está.
- Muito obrigado, sir!

No apartamento, ele deixa as compras na entrada e se despede:

- Mais alguma coisa?
- Hmm... não. Muito obrigado!
- Boa noite.
- Boa noite.

Ele retira o ragol, a hattra e a pequena touca da cabeça, deixa-as sobre o sofá e agora retorna ao motivo inicial da visita:

- Venha ver os quartos.

Apresenta uma das duas suítes:

- Essa está alugada por 10.

Segue então para os dois quartos que compartilham um banheiro:

- E este é o quarto que seria para você. Todo mobiliado! Veja bem: não é qualquer imóvel. Tudo decorado com o que há de melhor, e com bom gosto. Ao menos na minha opinião. Fui eu mesmo que decorei!

Papéis de parede de listras verdes e detalhes florais. Cama grande com adornos barrocos. Na parede um quadro de vaso. Cortinas na mesma cor da coberta: tecido verde metálico semi-brilhante. Um luxo. De fato, gosto não se discute.

- E então, gostou?
- Sim, muito, mas veja bem... eu tenho a minha mobília...
- Ah! Mas isso é fácil de resolver. Eu posso comprar e colocá-la em algum de meus outros imóveis.
- Mas a questão do preço...
- Bom, isso é negociável. Você tem algum dia da semana livre?
- O que é esta porta?
- Este é o quarto de empregadas que te falei. Esse é 3 mil, mas a porta está trancada hoje... mas podemos negociar, se você trabalhar para mim. Preciso de alguém para ajudar a controlar a contabilidade de meus negócios, e vejo que você tem boa índole, é de confiança.
- E como seria este trabalho?
- Sente-se. - Ele vai até a cozinha e volta com uma latinha de suco de goiaba e continua:
- Gostou da vista? Olha essa decoração! Essa é a parte da casa que mais gosto.

Sofá com adornos combinando com uma mesa de centro com adornos que não combinam com a TV de plasma, mas ficariam bem com um gramofone. No chão, jaz a pele de um felino, com a boca grande e olhos bem abertos. Na parede, um quadro de cavalo, na outra, um outro grande quadro com paisagens bucólicas de uma Europa medieval.

- Mas qual é o tipo de trabalho que você oferece?
- Eu preciso de um ajudante para meus negócios. Você é do Brasil, né? Uma de minhas idéias e começar a importar coisas do Brasil. Coisas que haja por lá e que não haja cá.
- O que, por exemplo?
- Você é que pode me dizer! Você é de lá, deve saber. Mas entenda as possibilidades financeiras por trás disso: o Brasil é hoje a última fronteira para os árabes. China? Todo mundo já está saturado de coisas chinesas. Índia? A Índia é aqui. Europa? Estados Unidos? Eles pegam um avião nas férias e pronto, já conhece tudo. Mas o Brasil não! Eles não conhecem nada do país, e tem muita curiosidade em conhecer. Quando você volta para o Brasil? Seria perfeito! Você poderia me guiar pelo país e me mostrar coisas que poderíamos trazer para cá.
- O que por exemplo?
- Vou dar um exemplo: nós poderíamos trazer comprar uma fazenda, e criar animais que hajam por lá, e que não hajam cá.
- Vacas?
- Não! Macacos, por exemplo.
- Criar macacos?! Em uma fazenda?!
- Sim!
- Veja bem... não dá.
- Por que não?
- Olha... uma fazenda de macacos? Não daria certo. Macacos são animais nômades e territorialistas, não dá para criar uma fazenda, como gado. Eles precisam de uma floresta e de uma grande área para viver.
- Ah, então a gente pode pegá-los na mata e trazer para cá.
- Veja bem... tráfico de animais é crime. Não dá para trazê-los.
- Como não? A gente pode colocá-los dentro da mala de mão, bem apertadinho, e trazer.
- Olha, não funciona isso. Isso dá cadeia. Não dá.
- E aqueles papagaios gigantes?
- Arara? É animal silvestre também. Não dá.
- Ah, que pena... - ele bebe um pouquinho mais de suco pensativo e torna ao assunto - então a gente pode comprar uma fazenda e criar outros animais. Há uma série de outros animais que há por lá e que não há por aqui. Lhamas, por exemplo...
- Lhamas não são do Brasil... são dos Andes, Bolívia, Peru...
- Ah... mas a gente pode comprá-los na Bolívia e criá-los na fazenda no Brasil, não pode?
- Olha... acho que o bicho não vai se adaptar. Mas enfim...
- Tá. Então pense em alguma coisa. Há artistas no Brasil? A gente poderia alugar um apartamento como esse e organizar uma noite brasileira, com exposição de obras de arte. No meio da noite, entrariam um grupo daquelas pessoas que dançam para fazer uma exibição. As pessoas querem ver isso, e elas pagarão o preço. Se for por exemplo, 100 dh, iríamos encher o apartamento.
- Poderíamos trazer artesanatos.
- Isso. E músicos? Dançarinos? Poderíamos organizar um show noturno. Traríamos os artistas e eles receberiam um salário e mais uma porcentagem nas vendas. Assim, ele ganha e nós também. Poderíamos deixá-los em uma casa em Ras Al Khaiman com diversas facilidades durante o dia: jet ski, campo de golfe, e à noite, eles trabalham.
- É uma boa idéia.
- E como é o mercado de iates no Brasil? O preço é melhor que aqui? Poderíamos comprar iates lá no Brasil e vendê-los por aqui.
- Iates? Não tenho a menor idéia.
- Pesquise para mim, por favor.
- Sim...
- Poderíamos comprar um grande iate, e montar dentro dele um restaurante típico brasileiro, com banda e dançarinos... as pessoas pagariam para viajar nele, seria um sucesso. E espero que a legislação brasileira não seja tão chata quanto à alemã. Eu quase comprei um navio do exército alemão da época da segunda guerra, mas o governo alemão barrou. Que gente complicada! Imagine o navio ali embaixo (apontando para a Marina), com um restaurante dentro... seria fanstástico!
- Sim, sim... pois é, já está tarde.
- Ok. Mas pense nisso.

A caminho do elevador, uma última reflexão:

- Escute: veja o mundo de possibilidades a sua volta. Veja esses apartamentos: poderíamos alugar dois deles, você contrataria as garotas do Brasil... faríamos um clube privê.
- Ok. Boa noite.
- Ok. Pense nisso. Aguardo seu telefonema amanhã.
- Ok. Boa noite.
- Boa noite.

No dia seguinte, não telefonou.

8 comentários:

Anônimo disse...

Criar macacos em uma fazenda... como não pensei nisso antes...

[]s
Cláudio Maesi

iglou disse...

Outra idéia: leite de garça!

Anônimo disse...

Pergunte a ele se interessa levar um pouco de garotos das Febens, para diminuir o nosso prejuizo aqui no Brasil.....

Edu, Jane e Carol disse...

Parece que o pessoal daí tem mais espírito empreendedor que os daqui...

Anônimo disse...

cara, cada coisa mais nonsense...
depois dum bigodudo ter descobrindo seus fundos agora vc tá quase virando cafetão internacional? hehehe...
putamerda portuga, a situação tá ficando cada vez mais feia pro seu lado!

e que lance é esse de procurar casa? vc não tava bem em 'honolulu'? onde vc vai enfiar seu caiaque? :)

falou!

Anônimo disse...

Da mesma forma que a primeira parte da história (se é que é o mesmo cara, porque parece), a melhor coisa que eu posso escrever aqui é "hummm..."

abraços

Anônimo disse...

Abra o olho. Tem tem gente agente no pedaço. Fique esperto. Tá jogando verde, tá jogando o anzol. Se você engolir o anzol, será difícil provar que focinho de porco não é tomada!

Anônimo disse...

cara, vc pode estar perdendo a oportunidade de ser a primeira franquia do Gennaro no exterior!!!

murilo.