Fim de tarde de uma segunda-feira chuvosa. A mulher procura meu nome nos arquivos.
- Voilà! - e me entrega o envelope.
- O resultado já foi enviado para o doutor?
- Sim, monsieur...
Era um exame de sangue simples de rotina. Na última hora, pedi que adicionasse os testes de HIV.
- Sem problemas! Adiciono também o teste de Hepatite C, d'accord?
O trato era esse: em caso de qualquer anomalia, ele entraria em contato. Mas 17h era ainda muito cedo. Em vez de abrir o envelope, preferi seguir até o metro com o envelope na mão.
RER A, destino Boissy. Carro de 2 andares. Escolho o banco mais ao fundo do andar mais alto. O dia não era dos melhores: no dia anterior, terminara um relacionamento com a mais recente "mulher da minha vida". Isso dói, mas não era a causa do tormento: há muito que já não usávamos preservativo. Ela estava tranqüila, convencida com minhas respostas. Eu não: omiti fatos, aleguei que não havia risco e não a protegi de minhas dúvidas. Agora, envelope na mão, tinha ali uma resposta com um potencial devastador que extrapolava a minha existência... eis aí uma boa definição de remorso: quando se constata que o seu destino, como uma nau descontrolada, acerta em cheio o barquinho alheio, muitas vezes tão especial. Eu sentia remorso do que não acontecera, e isso me tirava a fome, travava a respiração e trazia um estranho calafrio nos ombros. Em meio ao turbilhão, pensava em todas as hipóteses e em algo que me confortasse e me trouxesse dignidade caso o pior caso se confirmasse.
Deixemos o envelope devidamente fechado. Ainda não é hora de abri-lo. Voltemos a onde tudo isso começa: Teerã, dezembro de 2007.
26.9.08
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Um comentário:
Anda logo, que eu tô agonizando aqui.
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