
Frio: na fonte da praça Iman Khomeini, a água formava estalactites sobre os cabos de aço que sustentavam bandeirinhas decorativas de alguma data especial. No Irã, trabalha-se 6 dias por semana, mas há muitos feriados para compensar. É o que dizem (digo isso apenas para justificar as bandeirinhas congeladas, mas temo que isso não explique nada. Mania de querer explicar tudo).

Não é a melhor área de Tehran: a parte rica fica ao norte, na encosta da montanha, em direção à Darvand, onde neva. Bairros onde vivem a classe média e alta iraniana, comerciantes armênios, algo muito semelhante à Oscar Freire (oh, São Paulo: saudosismo irracional; por vezes me pego a chamar-te de minha. Oh, identidade, essa ilusão: nunca foste, nunca serás). Ali, seguindo da praça pela rua Amir Kabir, é a região das "auto-pecas": pneus, correntes de pneus para neve e tapetes de carro se acotovelam na calçada sobre os pedestres. Entre estas lojas, um ponto de encontro de estrangeiros que seguem o roteiro "low-budget" do guia Lonely Planet: o Mashad Hotel.
No início da noite, na recepção, um pequeno corredor com um banco longo de cada lado, os turistas se espremiam e fumavam para se aquecer, enquanto o gerente do Hotel blasfemava: o site do hotel, principal meio de contato com estrangeiros, havia sido bloqueado por conta do embargo norte-americano.
- E o que é que eu tenho a ver com isso? Eu tenho cara de terrorista? Deixem-me trabalhar! - justo ou não, nao julgo (o que por si só, já é um julgamento).
Ambiente "internacional": dentre os turistas, um holandês que viera de bicicleta. Um ciclista belga que se acidentou na Turquia e seguira de trem, mas que agora se encontrava sem dinheiro, apenas com cartões de crédito (que não são aceitos no Irã). Um garoto neo-zelandês que terminara seus estudos e tirara um ano para realizar sua Grande Viagem antes de iniciar seus estudos superiores. E uma oriental. Chamemo-la de Yoko. Dentro do hotel, terra franca; não usava véu. E fumava entre os homens.
- Sao 4.500 tomans por dia - informa o gerente, acendendo a luz do quarto. O equivalente a 4,5 dólares. Sao 5 camas: duas de cada lado perpendiculares à rua, e uma à parede oposta à janela. Do lado de lá, o coreano que dorme cobre o rosto. Do lado de cá, roupas de mulher. Eduardo escolhe a cama do lado de lá; fico do lado de cá. Misericórdia ao coreano, apagamos a luz e na luz-de-porta aberta, abrimos as malas. Neste ínterim, entra a dona das roupas.
- Brasileiros?
- Sim.
Ela se empolga e começa a falar palavras em português: morara antes com uma brasileira.
- E como é Dubai?
Pergunta dificil, resposta longa. Ela senta perto na cama porque a voz é baixa (o coreano dorme). O banheiro é coletivo e o Eduardo vai e volta do banho. Por fim, o novo ocupante da quinta cama chega. Eles falam a mesma língua e o interesse dela agora muda: seguem fumar e conversar lá fora. Hora de dormir.