27.3.09

Isso você não lerá nos Emirados Árabes

Dêem uma olhada nessas notícias:

http://archives.lematin.ch/LM/LMS/suisse/article-2008-07-84/le-tribunal-de-police-a-tranche-plus-vite-que-prevu-dans-l-affaire-du-cheikh-au-ceinturon-falah


http://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/2008/07/01/corte_suica_condena_xeque_arabe_por_atacar_americano_em_hotel_de_luxo_1406064.html


Esse é o tipo de notícia que você não encontrará em nenhum jornal dos Emirados Árabes. Censura à parte, o conteúdo delas pouco interessa: é uma questão de trato pessoal, e que de fato, não há interesse (público) em ser noticiada.

Mas se você fosse dono de um país, você permitiria que falassem mal de você nos jornais? Daí vem o ditado:

Sheik manda prendê. E depois manda soltá.

O curioso é que eu tenho quase certeza de ter lido esta notícia no Le Monde à época. E pesquisando nos arquivos, não a encontro. Oxi... que esquisito. Eu devo estar ficando louco.

21.3.09

Sobre os boatos

Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Dubai e a crise: o estouro da bolha":
Ya Habib!! Pera ai!! Olha euzinha na area!!

Estas a par do boato de que o Iran vai atacar Dubai brevemente?

Por gentileza....estude o caso, pesquise e apague esse comentario....sabe como eh....tudo conspira e melhor eh deixarmos a massa longe disso afinal, eu e familia ( incluindo os animais que os viadinhos gringos abandonam na rua e eu recolho!) estamos aqui em Dubai ainda! Mas gostaria muuito de saber tua opiniao. Tentarei achar seu email aqui para, se vc quiser, trocarmos figurinhas!

Massalama,

XXXXXX


Postado por Anônimo no blog Dubai F. C. em Sábado, 21 Março, 2009

Oi Sheika,

Diz o dito popular: "toda mentira tem um fundo de verdade". Penso que para a atual conjuntura, esse não é o caso.

Apesar das disputas pelas ilhas do Golfo, os Emirados Árabes é um importante parceiro de Teheran, servindo como intermediário para driblar o embargo econômico imposto ao país.

Essa hipótese só ganharia sentido em caso de um eventual confronto entre o Irã e forças israelenses ou americanas no Golfo. Neste caso, tudo ficaria imprevisível.

Mas se um eventual ataque à Dubai era uma hipótese paupável durante a Era Bush, hoje, após o discurso conciliatório de Obama em pleno Noruz, torna essa possibilidade ainda mais remota.

A ver como se desenvolve o relacionamento entre Irã e Estados Unidos daqui pra frente. O resto são boatos e suposições.

Abraços de ex-xeque,

Luis

13.3.09

Dubai e a crise: o estouro da bolha

Tocou hoje o telefone aqui. Atendi e era o Norman. Grande, Norman! Ele veio lá da Tailândia visitar a família aqui em Paris. Saímos para por o papo em dia.



E não é que o cara lembrou de mim? Trouxe um pacote de biscoito lá da Tailândia. "É caseiro!", disse ele. Puxa, que legal. E o biscoito é bom... já quase matei o pacote enquanto escrevo esse post.



Isso me deixou meio saudoso. Chegando aqui em casa, resolvi olhar o passado e encontrei essas fotos:





Essa foto foi tirada em 2007. Dois anos depois, não sobrou um por lá para contar história: o Driss voltou pra Nice, o Pankaj casou com uma garota sugerida pelo pai e foi para Nova Iorque trabalhar, o Eduardo não casou mas também foi para os Estados Unidos, e por fim, o Norman, que foi para a Tailândia em busca do amor.

Estranho fenômeno esse das migrações. O que motiva essa gente toda, com histórias e motivações tão distintas, a entrar e sair de um país, como em um movimento sincronizado? Seria a crise ou simplesmente a concretização de um movimento natural, como as ondas do mar? Por esta lógica, nós todos da foto chegamos ao mesmo tempo, e teríamos já pré-programado um prazo-limite no país destino. Ou talvez seja a crise...

Seja qual for a razão, o fato é que muita gente tem abandonado o "sonho" e a "magia" (hahahahaha) de Dubai nos últimos meses. E não são poucas: tenho conversado bastante com meus amigos que lá estão, e as histórias são as mesmas:

- a Shaikh Zayed Road está vazia. Cadê os congestionamentos de antes?
- boatos dão conta de que em dezembro passado, os pedidos de cancelamento de vistos atingiram uma taxa de 5.000/dia;
- meu amigo Norman contesta o número acima, mas ele mesmo foi embora...
- o governo começa a organizar leilões de carros abandonados há meses no aeroporto de Dubai;
- empresas anunciam unilateralmente e deliberadamente reduções de salários (isso mesmo! Leis trabalhistas? Isso é coisa de paises que ainda usam esse sistema politico atrasado chamado "democracia");
- boatos de que o Sheik está "quebrado" (duvido!);

Mas até aí, boato é boato. Mas aí a coisa começa a ficar interessante quando os boatos começam a ser embasados por notícias de fontes sérias e oficiais. A Arabian Business informa que, ali no Qatar, o país-ilha ao lado, observou-se um aumento de 791% no número de carros abandonados.

Como assim, carros abandonados? Explico o óbvio: o cidadão vislumbrado, que se "encanta" pelas "magias" do Golfo, que adora ostentar, vai lá no banco e pega um financiamento de um carro cuja parcela custa metade do seu salário mensal. Com a outra metade, ele paga um financiamento de apartamento de luxo. Aí um belo dia ele descobre que foi demitido. O que ele faz? Isso: vai dirigindo até o aeroporto, estaciona calmamente o veículo direitinho no aeroporto e... bye-bye Oriente Médio! Vai com a roupa do corpo, deixa pra trás até animal de estimação, abandonado na rua.

E por mais boatos que circulem, todos os indicadores básicos mostram que sim, Dubai tem motivos para se preocupar e que a crise chegou:

O petróleo

O petróleo caiu de US$ 121/barril em maio/2008 para pouco mais de US$ 47/barril (cotação desta semana);

O turismo

Até o ano passado, Dubai era o principal destino aéreo do Reino Unido, transportando mais de 1 milhão de passageiros nessa linha em um ano. Foi mais gente de Londres à Dubai, do que de Londres à Nova Iorque! Só que agora... basta dizer que com a crise, a libra esterlina, que antes valia perto de 1,5 euros, está muito próximo da paridade com a moeda única européia. Dá pra imaginar o impacto dessa crise sobre esses "vôos recreacionais" que enchiam os malls da cidade, não? Isso afeta o carro-chefe de Dubai, que aposta no Turismo como tábua de salvação;

Fundos soberanos

Dizem que os fundos soberanos de Dubai (esse mesmo que o Ministro Mantega começou a tocar no assunto, mas que agora ninguém sabe, ninguém viu) estavam aplicados em grande parte nos mercados americano e britânico... que derreteram. Um bom exemplo (que não tem a ver com Dubai, mas que ilustra bem a situação) é o preço da ação do Citi: a ação do banco chegou a valer 55 dólares, e no pior momento da crise, era negociada a menos de 1 dólar. Um dos grandes recapitalizadores do Citi em mais de uma oportunidade foi o Rei Abdullah, da Arábia Saudita. Dinheiro que evaporou.

Crise de crédito

Como você já deve ter ouvido por aí, a crise mundial é de crédito. E em Dubai não é diferente. Vamos a um exemplo e suas conseqüências: quando cheguei em Dubai, no banco me deram 2 cartões de crédito cada um com 22 mil dirhams de crédito (dava pra comprar um carro zero no cartão!) e mil e uma ofertas de empréstimos à 4,5%a.a.: para mobiliar a casa, adiantar o aluguel...

... qual era o impacto de tanto dinheiro na praça?

1. Um monte de libanêses de camisa aberta e gel no cabelo e ingleses de cabeça raspada andando de porsche, mercedes e outros carros caros;
2. Uma espiral nos preços de aluguel e uma arrogância dos proprietários e agentes imobiliários: pagamento de aluguel? Só em um ou dois cheques anuais!

Agora a coisa mudou: o Norman me conta que, para conceder empréstimos, o HSBC exige comprovação de salário de no mínimo 20 mil dirhams/mês. E agora não é mais 4,5%. Já é 5, 6%...

... o impacto no setor imobiliário está sendo hilário e com um delicioso sabor de vingança contra esses bandidos que controlam o setor:

- você lembra da Damac? Isso, aquela que rifava jatinhos e ilhas, e dava um carro de luxo na compra de uma propriedade? Pois é, ela já dispensou mais de 200 funcionários e recebeu uma injeção de 60% de capital de um grupo egípcio.

- e agora, o mais gostoso: o preço dos imóveis dá indícios de entrar em queda-livre. O anúncio abaixo (no Dubizzle), uma casa nos Springs a 90 mil dirhams/ano, já representa 50% de queda em relação aos valores negociados no ano passado. E os proprietários, de uma hora pra outra, ficaram humildes, humildes, aceitando pagamento em 12 cheques:



E aqui, uma reportagem sobre a queda nos preços do mercado imobiliário em Dubai.

Conclusões

O comportamento do xeque

Não é a primeira vez que Dubai enfrenta uma crise, embora essa tenha características peculiares: petróleo em baixa, mercado imobiliário em queda.

Ele vai o que sempre fez em tempos de crise: continuar a investir.

Para os oportunistas do Real State

Se você é mais um "bem sucedido empreendedor do mundo imobiliario norte-americano" que teve a genial ideia de "expandir seus negócios" abrindo uma filial de sua "multinacional" de três funcionários em Dubai, amiguinho, a farra acabou!

Foi-se o tempo em que você ganhava em comissão de venda de uma casa mais que o salário anual de um engenheiro qualificado. Agora é re-a-li-da-de, camarada! Todo mundo está acordando para o fato que ganhar o pão do dia-a-dia é mais difícil do que se imagina.

Mas na crise de uns pode estar a oportunidade de outros: se você recebeu agora uma oportunidade para seguir para o Golfo, se tiver margem para negociar seu salário, você encontrará uma Dubai mais humilde, com agentes imobiliários mais modestos. E com sorte, pagará pelo preço do aluguel de uma casa um valor mais próximo do "justo".

Dica: a hora da revanche

Na hora de fechar um contrato de aluguel, faça como a maioria dos bandidos que trabalhavam no setor imobiliário ate o ano passado (isso o Amaury Júnior e a Hebe não contam, né?). Aperte a mão do cidadão, diga verbalmente que "fechou". Continue, mesmo após dar a sua palavra, a negociar com outros agentes. Na hora de assinar o contrato, diga que mudou de ideia e que voce só paga 75% do valor acertado. Vigança é um prato que se saboreia frio... e a mesa está pronta.

11.3.09

O que é um Sheik?

Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Fugindo da mordida do leão":

Luis,
Por favor, não encontrei um lugar melhor para colocar minha pergunta então vai aqui mesmo. Desculpe a minha ignorância mas o que é um sheik e o que ele faz? Qual a diferença para Xeque árabe?
Obrigada,
Mirella

Postado por Anônimo no blog Dubai F. C. em Quarta-feira, 11 Março, 2009

Olá Mirella,

Um sheik é a mesma coisa que Xeque árabe. Escrevo sheik porque estou "inovando" com a língua.

Mas há uma razão para isso: sheik é a maneira como anglófonos chamam o xeque. Na verdade, nem isso: a transliteração mais correta do som dessa palavra em árabe para o inglês é shaikh.

Escrevo errado? Aí é o caso de se perguntar o que é o certo, pois a pronúncia de xeque não tem nada a ver com o som da sua palavra de origem. Em árabe, diz algo como xêrhh (esse rhh é pra imitar o som aspirado e raspado, gutural, de um 'r' carioca). Enfim, como já disse em outras oportunidades, o correto mesmo só em árabe. E para o feminino, adiciona-se um 'a' ao final: xêrhhha.

Para terminar: sheik, shaikh, , xeque, xêr em árabe é apenas um título de respeito. Você não precisa ser dono de um Emirado e das pessoas que nele vive para ser chamado como tal. Pessoas mais idosas e respeitadas por sua autoridade ou notoriedade também são chamados de sheik. A tradução mais próxima para o português dessa palavra acho que é "o fudidão".

Para designar especificamente o dono de um Emirado e das almas que nele vivem, o termo mais preciso (e nem sempre usado) é Emir (ou Amir, mais uma vez, o correto, só em árabe), que tem mais a ver com "chefe". Daí vem a palavra Emirado para designar a região onde moram seus súditos, e Amiri Guard, para a sua guarda especial que o protege.

Bom, é isso.

Abraço de ex-sheikh, xêrhh, shaikh, Cheik, xeque...

Luís

6.3.09

Fugindo da mordida do leão

Nando Melo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Declaração
de sada definitiva II":

Olá Sheik,

Lendo suas valiosas explicações, me deparei com uma dúvida em
relação ao envio do dinheiro ganho no exterior para o Brasil.
Tendo eu, feito a declaração de sada definitiva do País, posso enviar
todos os meses valores para uma conta poupança no Brasil no período em
que estiver no exterior? Se eu enviar valores durante este ano todo, como
terei que declarar esta poupança no ano que vem? Tenho que enviar de
alguma forma específica ou pode ser através de agências de envio?

Obrigado e um abraço,
Fernando



Postado por Nando Melo no blog Dubai F. C. em Terça-feira, 03 Março,
2009

Olá Fernando,

Essa sua dúvida é a de todos, hehehe. Mas vamos por partes:

1) Como transferir: essa é a mais fácil. Na verdade, pouco importa a maneira como você manda. Todo banco tem o serviço de transferência internacional. Para isso, você precisará do código IBAN de sua conta de destino (pergunte na sua agência no Brasil). O problema é que esse é um processo meio arcaico, às vezes a transferência se completa somente após a passagem da ordem por vários bancos, que cobram tarifa... se compensa fazer pelo banco ou através de agências de transferência, aí você precisa fazer as contas. Independente do meio, faça sempre primeiro uma transação de teste com baixo valor.

2) Montante da transferência: para uma transferência até 5.000 reais, em geral, os bancos já fazem o contrato de câmbio automático e o dinheiro já cai na sua conta. Para quantias maiores, você precisará que seu procurador legal no Brasil passe na agência para assinar o contrato de câmbio.

3) Durante a assinatura do contrato de câmbio, poderá ser solicitada uma justificativa da origem do dinheiro. O seu contrato de trabalho e cópia da declaração de saída definitiva servem como tal (até onde sei).

4) Como declarar no ano seguinte: aí, há controvérsias. O texto da Receita dá margem a diversas interpretações. Vejamos o que ele diz:

Remuneração do trabalho e de serviços

Os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços, exceto serviços técnicos e de assistência técnica e administrativas, pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a não-residente sujeitam-se à incidência do imposto na fonte à alíquota de 25%.


Consultei aqui o conselho de sábios barbudos, e em uma mesa redonda calorosa, chegou-se ao seguinte entendimento:

Essas regras referem-se a rendas geradas no Brasil, ou seja, pagamentos efetuados ao não-residente de uma fonte situada no Brasil. Para rendimentos recebidos no exterior, vale a legislação do país de onde os recursos são originários.

Desta forma, você pode transferir seus recursos sem medo de ser feliz. Você não pagará imposto sobre o montante enviado, mas apenas sobre a renda gerada por ele em caso de aplicá-lo no Brasil. Se você aplicar esse dinheiro e ainda assim, sobre o lucro auferido. Aliás, se não me engano, a poupança é isenta de imposto.

Bom, acho que é isso. Não agradeça a mim, mas ao conselho de sábios barbudos.

Abraço de ex-sheik,

Luís