Tocou hoje o telefone aqui. Atendi e era o Norman. Grande, Norman! Ele veio lá da Tailândia visitar a família aqui em Paris. Saímos para por o papo em dia.
E não é que o cara lembrou de mim? Trouxe um pacote de biscoito lá da Tailândia. "É caseiro!", disse ele. Puxa, que legal. E o biscoito é bom... já quase matei o pacote enquanto escrevo esse post.
Isso me deixou meio saudoso. Chegando aqui em casa, resolvi olhar o passado e encontrei essas fotos:
Essa foto foi tirada em 2007. Dois anos depois, não sobrou um por lá para contar história: o Driss voltou pra Nice, o Pankaj casou com uma garota sugerida pelo pai e foi para Nova Iorque trabalhar, o Eduardo não casou mas também foi para os Estados Unidos, e por fim, o Norman, que foi para a Tailândia em busca do amor.
Estranho fenômeno esse das migrações. O que motiva essa gente toda, com histórias e motivações tão distintas, a entrar e sair de um país, como em um movimento sincronizado? Seria a crise ou simplesmente a concretização de um movimento natural, como as ondas do mar? Por esta lógica, nós todos da foto chegamos ao mesmo tempo, e teríamos já pré-programado um prazo-limite no país destino. Ou talvez seja a crise...
Seja qual for a razão, o fato é que muita gente tem abandonado o "sonho" e a "magia" (hahahahaha) de Dubai nos últimos meses. E não são poucas: tenho conversado bastante com meus amigos que lá estão, e as histórias são as mesmas:
- a Shaikh Zayed Road está vazia. Cadê os congestionamentos de antes?
- boatos dão conta de que em dezembro passado, os pedidos de cancelamento de vistos atingiram uma taxa de 5.000/dia;
- meu amigo Norman contesta o número acima, mas ele mesmo foi embora...
- o governo começa a organizar leilões de carros abandonados há meses no aeroporto de Dubai;
- empresas anunciam unilateralmente e deliberadamente reduções de salários (isso mesmo! Leis trabalhistas? Isso é coisa de paises que ainda usam esse sistema politico atrasado chamado "democracia");
- boatos de que o Sheik está "quebrado" (duvido!);
Mas até aí, boato é boato. Mas aí a coisa começa a ficar interessante quando os boatos começam a ser embasados por notícias de fontes sérias e oficiais. A Arabian Business informa que, ali no Qatar, o país-ilha ao lado, observou-se um aumento de 791% no número de carros abandonados.
Como assim, carros abandonados? Explico o óbvio: o cidadão vislumbrado, que se "encanta" pelas "magias" do Golfo, que adora ostentar, vai lá no banco e pega um financiamento de um carro cuja parcela custa metade do seu salário mensal. Com a outra metade, ele paga um financiamento de apartamento de luxo. Aí um belo dia ele descobre que foi demitido. O que ele faz? Isso: vai dirigindo até o aeroporto, estaciona calmamente o veículo direitinho no aeroporto e... bye-bye Oriente Médio! Vai com a roupa do corpo, deixa pra trás até animal de estimação, abandonado na rua.
E por mais boatos que circulem, todos os indicadores básicos mostram que sim, Dubai tem motivos para se preocupar e que a crise chegou:
O petróleo
O petróleo caiu de US$ 121/barril em maio/2008 para pouco mais de US$ 47/barril (cotação desta semana);
O turismo
Até o ano passado, Dubai era o principal destino aéreo do Reino Unido, transportando mais de 1 milhão de passageiros nessa linha em um ano. Foi mais gente de Londres à Dubai, do que de Londres à Nova Iorque! Só que agora... basta dizer que com a crise, a libra esterlina, que antes valia perto de 1,5 euros, está muito próximo da paridade com a moeda única européia. Dá pra imaginar o impacto dessa crise sobre esses "vôos recreacionais" que enchiam os malls da cidade, não? Isso afeta o carro-chefe de Dubai, que aposta no Turismo como tábua de salvação;
Fundos soberanos
Dizem que os fundos soberanos de Dubai (esse mesmo que o Ministro Mantega começou a tocar no assunto, mas que agora ninguém sabe, ninguém viu) estavam aplicados em grande parte nos mercados americano e britânico... que derreteram. Um bom exemplo (que não tem a ver com Dubai, mas que ilustra bem a situação) é o preço da ação do Citi: a ação do banco chegou a valer 55 dólares, e no pior momento da crise, era negociada a menos de 1 dólar. Um dos grandes recapitalizadores do Citi em mais de uma oportunidade foi o Rei Abdullah, da Arábia Saudita. Dinheiro que evaporou.
Crise de crédito
Como você já deve ter ouvido por aí, a crise mundial é de crédito. E em Dubai não é diferente. Vamos a um exemplo e suas conseqüências: quando cheguei em Dubai, no banco me deram 2 cartões de crédito cada um com 22 mil dirhams de crédito (dava pra comprar um carro zero no cartão!) e mil e uma ofertas de empréstimos à 4,5%a.a.: para mobiliar a casa, adiantar o aluguel...
... qual era o impacto de tanto dinheiro na praça?
1. Um monte de libanêses de camisa aberta e gel no cabelo e ingleses de cabeça raspada andando de porsche, mercedes e outros carros caros;
2. Uma espiral nos preços de aluguel e uma arrogância dos proprietários e agentes imobiliários: pagamento de aluguel? Só em um ou dois cheques anuais!
Agora a coisa mudou: o Norman me conta que, para conceder empréstimos, o HSBC exige comprovação de salário de no mínimo 20 mil dirhams/mês. E agora não é mais 4,5%. Já é 5, 6%...
... o impacto no setor imobiliário está sendo hilário e com um delicioso sabor de vingança contra esses bandidos que controlam o setor:
- você lembra da Damac? Isso, aquela que rifava jatinhos e ilhas, e dava um carro de luxo na compra de uma propriedade? Pois é, ela já dispensou mais de 200 funcionários e recebeu uma injeção de 60% de capital de um grupo egípcio.
- e agora, o mais gostoso: o preço dos imóveis dá indícios de entrar em queda-livre. O anúncio abaixo (no Dubizzle), uma casa nos Springs a 90 mil dirhams/ano, já representa 50% de queda em relação aos valores negociados no ano passado. E os proprietários, de uma hora pra outra, ficaram humildes, humildes, aceitando pagamento em 12 cheques:
E aqui, uma reportagem sobre a queda nos preços do mercado imobiliário em Dubai.
Conclusões
O comportamento do xeque
Não é a primeira vez que Dubai enfrenta uma crise, embora essa tenha características peculiares: petróleo em baixa, mercado imobiliário em queda.
Ele vai o que sempre fez em tempos de crise: continuar a investir.
Para os oportunistas do Real State
Se você é mais um "bem sucedido empreendedor do mundo imobiliario norte-americano" que teve a genial ideia de "expandir seus negócios" abrindo uma filial de sua "multinacional" de três funcionários em Dubai, amiguinho, a farra acabou!
Foi-se o tempo em que você ganhava em comissão de venda de uma casa mais que o salário anual de um engenheiro qualificado. Agora é re-a-li-da-de, camarada! Todo mundo está acordando para o fato que ganhar o pão do dia-a-dia é mais difícil do que se imagina.
Mas na crise de uns pode estar a oportunidade de outros: se você recebeu agora uma oportunidade para seguir para o Golfo, se tiver margem para negociar seu salário, você encontrará uma Dubai mais humilde, com agentes imobiliários mais modestos. E com sorte, pagará pelo preço do aluguel de uma casa um valor mais próximo do "justo".
Dica: a hora da revanche
Na hora de fechar um contrato de aluguel, faça como a maioria dos bandidos que trabalhavam no setor imobiliário ate o ano passado (isso o Amaury Júnior e a Hebe não contam, né?). Aperte a mão do cidadão, diga verbalmente que "fechou". Continue, mesmo após dar a sua palavra, a negociar com outros agentes. Na hora de assinar o contrato, diga que mudou de ideia e que voce só paga 75% do valor acertado. Vigança é um prato que se saboreia frio... e a mesa está pronta.
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6 comentários:
Realmente estranho este post nao ter nenhum comentario. Quando eh para pedir emprego, trocentas pessoas postam aqui suas barbaridades.
Agora, quando a verdade eh escancarada, todos quietos!
Isso eh oportunismo e hipocrisia. Melhore se recolherem mesmo nos seus ninhos de rato!
Talvez algum dia os governantes deste pais percebam que trabalhadores que buscam um relacionamento de longo prazo com o pais representam um beneficio maior do que os especuladores volateis. Vai levar algumas centenas de anos ainda ...
Enquanto isso, contento-me com o raro prazer de assistir de camarote os exploradores se fodendo e tendo que dirigir taxis ilegais para pagar dividas em bancos e evitar a cadeia.
Acabou a festa, Hebe!
Caro amigo,Em novembro estarei participando de uma exposição em Dubai (www.indexexhibition.com )acabei achando o seu blog na net e achei bastante simpatico da sua parte em ajudar pessoas interessadas a viajarem para esta cidade.Gostaria de conhecer alternativas bastante econômicas para este projeto que durará apenas alguns dias,geralmente quando vou para Europa,costumo alugar quartos,ou usar albergues,existe esta opção lá?qual é o custo médio de alimentação em Dolar?Você conhece algum subsidio para artes? Desculpe pelas perguntas e agradeço pela generosidade em responder-las...Com os melhores cumprimentos,
Artista
Excelente post. Muito bem escrito!
Aproveitando, seu blog é fantástico!
Moro em Dubai (meu marido trabalha aqui desde 2007 e vim para cá em dez/08). A crise não nos pegou - e espero que não nos pegue!
Abraços, Juliana.
Oi, Sheik!
Não sei se v. pode me ajudar. Sou formada em direito no Brasil e vou fazer um curso de pós-graduação aqui em Dubai. Porém, para reconhecer meu diploma aqui, eles exigiram que ele seja reconhecido no Brasil pelo Min. Educação, Embaixada e Min. Rel. Exteriores para, então, eu reconhecê-lo no Min. Educação de Dubai.
V. sabe algo sobre esse procedimento ou teria alguma dica?
Desde já agradeço.
Ju.
Salam Alekum, amado ex-Sheike Luis!! Estive sumida, mas não deixei de te querer (ehehehheh!!)
Minhas andanças mudaram de rumo e, apesar de ter jurado nunca ir a um país comunista, cedi a curiosidade de conhecer o "dragão gigante". Passei um mês na China. Trilogia básica, Shanghai, Beijing, Xian, com todas as oportunidades de me aventurar pelo recheio deste país que como diz bem uma escritora chinesa: "A china de hoje parece um quadro de Picasso, tem olhos, boca e nariz, mas tudo fora de lugar!" Bem, mas esta é uma outra estória...
Passei por Dubai para rever os amigos e matar as saudades de um dos melhores tempos da minha vida.
Estive com a brasileira Cecilia Reinaldo, sei que posso falar o nome dela, pois ela é uma das pessoas mais respeitadas no Real State. Brasileira por acaso, foi para lá nos primórdios e contruiu uma carreira sólida e poderosa. Em abril de 2009, deu uma entrevista para a revista "Isto É Dinheiro",( http://www.terra.com.br/istoedinheiro/edicoes/603/imprime132332.htm lá embaixo, em economia)
aonde conta sucinta e claramente a realidade que tomou conta de Dubai. Ela diz: "É o caso das residências em Palm Jumeirah (...) que chegaram a valer US$ 40 milhões. Hoje custam US$ 15 milhões. E não é ruim, porque o preço pago foi de US$ 2 milhões". Assim sendo, a realidade que se abateu sobre Dubai é melhor do que se pensa, como disse ela: "O negócio estava exagerado. Agora voltou ao normal".
Eu acho que nos livramos dos especuladores imobiliários, a maioria russos, ávidos por dinheiro fácil em qualquer lugar do planeta! E aí cabe bem a questão da queda do preço do petróleo, a empáfia de muitos owners, e as consequencias materiais dos abusos capitalistas... No geral, ficou muito melhor, profissionais cada vez mais qualificados ainda vão e vem, a população estrangeira no país é de cerca de 80%. O sonho de todo migrante é voltar para sua terra natal rico para curtir a praia ou comprar uma casa nos suburbs... As obras estão ficando prontas, o complexo do Burj Dubai já esta 80% pronto, se considerarmos que tem 180 fases, está ótimo! O movimento é praticamente o mesmo... Neste mes foi inaugurado o metro de Dubai, 100.000, é, cem mil visitantes no primeiro dia! Ufa! quando vejo que Lula disse, ao saber que o Rio de Janeiro vai sediar as Olímpiadas de 2016, que ele já poderia morrer feliz... Eu penso:"Nowere like Dubai". beijão saudoso e aproveita Paris! pour profiter, l'amour et le rêve... Layla Fiusa laylaf@uol.com.br
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